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Escritos de Julio Ugarte y Ugarte
Coletânea de textos do professor Julio Ugarte y Ugarte

Os Dois Aspectos da Vontade (*)

A Vontade compreende dois aspectos, caracterizados por ser opostos, contrários, como se fossem, verdadeiramente, duas forças em luta, duas forças que se repelem, duas potências aniquiladoras, dois inimigos que disputam um ao outro a preponderância.

Cada um destes dois aspectos ou manifestações da Vontade, previstos ambos com todo o arsenal de pensamentos contrapostos, submergem ao espírito na confusão, nesse caos em que se encontram situados todos os homens em suas lutas interiores.

Ambas potências, parece que por sua vez cada uma delas pretende justificar-se, santificar-se, e encontra tudo lícito e justo. Esses dois aspectos se denominam Bem e Mal, porque o que obra o Bem como o que obra o Mal, os dois são impulsionados por esses dois aspectos ou manifestações da Vontade, que atua num e noutro sentido.

Estes dois aspectos têm a mesma origem, porque a Vontade é a que dirige a ação nos dois grandes agrupamentos, Bem e Mal; compreendidas, em suma, todas as ações humanas.

A razão e o juízo nada influem, porque os dois aspectos da Vontade têm suas razões, seus juízos.

Não há um só juízo, nem uma só razão; por isso é que vem o engano, a cegueira.

A estas duas expressões da Vontade, de agora em diante, chamaremos negativa e positiva, respectivamente, seja porque se dirijam até o Mal ou para o Bem.

A potência negativa, por sua vez, compreende dois aspectos muito marcados, um produzido pela Ignorância e outro produzido pelo Conhecimento. No primeiro caso, obra cegamente, sem reflexão, sem juízo, sem raciocínio; no segundo caso, sabendo, com pleno conhecimento do mal que efetua.

A potência positiva está, também, caracterizada por esta dualidade de sua ação, quando atua ignorantemente e quando atua com pleno conhecimento.

Exemplo destas quatro manifestações da Vontade:

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 Ignorância

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--- Negativa ------- |
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 Conhecimento

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Vontade -------

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 Ignorância

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--- Positiva -------- |

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 Conhecimento

O que come uma planta sem saber que é venenosa, o que a come com conhecimento de que ela é venenosa; o que faz um bem sem sabê-lo, o que faz sabendo que faz um bem.

Nestes quatro aspectos da Vontade, estão enquadradas todas as ações humanas.

Uma pessoa tem um desejo, este é um aspecto da Vontade. Esse pensamento pode estar controlado por outro, por vários ou por muitíssimos pensamentos antes de se produzir a ação física; mas estes pensamentos, como todos os pensamentos em geral, são produzidos pela mesma Vontade.

Crer que há pensamentos que nos vêm à imaginação independentemente da Vontade, é negar a origem deles, posto que todos os pensamentos aparecem na mente por efeito da mesma Vontade.

Como este assunto merece ser tratado com a necessária amplitude, por sua importância, assim o faremos, para deixar gravada na mente do leitor o fenômeno que se realiza e que depois esquecemos, não nos dando conta de que fomos autores desses pensamentos, senão nesta encarnação, em encarnações passadas.

Já foi dito, no referente aos descobrimentos efetuados por Gustave Le Bon, o papel que desempenha a Vontade: desejando descobrir, descobre-se; esforços perseverantes da Vontade, às vezes de durar décadas, deram por resultado o descobrimento das leis naturais, as propriedades gerais, como as particulares, de todos os corpos, correspondendo as primeiras à Física e as segundas à Química.

O mesmo autor demonstra como, desejando compreender, se desenvolve a inteligência, sublima-se esta e aparece o talento; esforçando-se por recordar, desenvolvem-se as diferentes classes de memória, correspondentes aos cinco sentidos; e, assim, sucessivamente, todas as faculdades mentais têm seu início na Vontade, que é exercitada consciente ou inconscientemente dos resultados a que chegará; sempre, desde o princípio, impulsionada por outra ou outras vontades como vemos desde que a criança principia a ir ao colégio. A criança, desejosa de conhecer tudo que a rodeia, pergunta; e todas estas perguntas que fazem as crianças em sua curiosidade, não é acaso sua Vontade de conhecer as coisas que a rodeiam?

Não me deterei a examinar nem a classificar as classes de perguntas que as crianças fazem, nem a inteligência com que fazem perguntas que a maioria dos pais não conhecem ou não conhecem bem, basta saber que é a Vontade a que produz o desejo, por mais que este apareça como um resultado desconhecido ou como resultado da necessidade, lei que nos obriga forçosamente a ter que atuar em harmonia com as leis naturais, pois bem sabemos, por onde quer que se examine o que nos rodeia, por todos os lados observamos que esta vida está completamente condicionada.

Nós não viemos a formar, a criar o mundo que nos rodeia: já o encontramos feito; isto o reconheceram os filósofos desde o princípio; então nossa vontade atua em um terreno completamente condicionado.

Não poderíamos imaginar um condicionamento livre, o que seria um absurdo, porque onde há lei não há liberdade. E os homens não podem violar jamais as leis naturais, sem os prejuízos consequentes as suas transgressões, inclusive até mesmo a morte.

Poderíamos viver sem o calor solar? Poder-se-ia viver com a ausência do calor? Poderíamos ver sem a luz? Poderíamos viver sem oxigênio, sem água, sem vegetação?

Nossa vontade está, pois, completamente condicionada, como o está o instinto nos seres inferiores, que, realmente, em si não é instinto, senão a manifestação clara de uma vontade, ainda que incipiente, essa Vontade que engendra a Natureza condicionada em que vivem todos os seres, desde o mineral, o vegetal e o animal.

Nossa Vontade move e dirige as coisas em harmonia com as circunstâncias deste condicionamento em que nos encontramos, pois nossa vontade não poderia alterar a ordem estabelecida, anteriormente preparada pela mesma Vontade Global. Neste sentido, é notório que a mínima observação do Universo físico considerado, nos faz ver um Plano Criador, no qual não se pode falar da Onipotência da Força Criadora, se não estiver acompanhada de uma Vontade Consciente que dirige, governa e sustenta este Universo, cujas leis que o dirigem são também manifestações de uma Vontade Todo-Poderosa, da qual nada poderia se livrar. Por exemplo: quem poderia evadir-se da lei do movimento? Sabemos que o repouso absoluto jamais poderia existir materialmente e que a Energia que produz a matéria está em constante movimento, transformando todos os átomos, nessa renovação permanente que se nota com mais claridade nos reinos vegetal e animal.

Ninguém, pois, que meditou sobre esta grande lei do movimento, poderia deixar de reconhecer seu valor para a vida condicionada em que vivem todos os seres; nem poderia desconhecer que essa condição, atribuída a uma Causa Superior que deu a Energia Inicial, pudesse ser obra do acaso, ou simplesmente obra da mesma Matéria que, em si, sendo uma Energia, em diferentes estados de condensação, não poderia ser uma força cega, que atuasse sem Sabedoria, senão, melhor, uma Energia sem limites, dirigida por uma Vontade Onipotente.

Aparentemente as coisas se movem por si sós; os astros giram ao redor de seus centros principais ou sóis; mais, se conhecemos já a lei do equilíbrio dos corpos, já não nos fica a menor dúvida de que assim como os astros se movem obedecendo a uma lei preexistente ao aparecimento do homem sobre a terra, identicamente terá que suceder com todos os átomos do Universo; o homem, portanto, não poderá se mover fora desse círculo sobre o qual gravita toda a Criação. Mais claramente, se o todo obedece, as partes que formam esse todo não poderiam deixar de obedecer, princípio absoluto que ninguém pode negar.

Desvincular a conexão existente entre a alma e o corpo, negar esta união e separar como coisa diferente as faculdades intelectuais ou potências da alma, seria uma obra absurda, porque todas as faculdades do homem giram ao redor de um Universo, fora do qual as faculdades humanas não vivem; muito ao contrário, são o resultado do condicionamento em que vivemos, porque ninguém poderia pensar em algo que primordialmente não o houvesse sido sugerido pelas impressões propiciadas pelos sentidos corporais, sem os quais não seria possível nossa existência neste plano inferior da Matéria.

Logo, nossa consciência é, pois, formada pelos conhecimentos proporcionados por esses sentidos, o que poderia se expressar dizendo que, sendo ela originariamente constituída por identidade com a Matéria, essa consciência é completamente material, porque material é a mente cujos pensamentos são sugeridos pelo mundo das sensações físicas.

Se suprimíssemos os cinco sentidos de uma pessoa, o Universo físico desapareceria para ela. É inegável, o único que poderia subsistir seria a Memória desse estado de consciência passada; mais, ainda, uma prolongação desse estado de consciência, em proporção à materialização da Mente pelo mundo dos sentidos, como se comprovou em inúmeros casos de materialização de almas que, havendo abandonado a terra, deram aviso aos seres queridos de sua separação do mundo, ou por meio de diferentíssimas manifestações que dão a entender que têm sua consciência post mortem, identificada com a vida material. Isto é algo tão vulgar que não se precisa recorrer ao Espiritismo, tão difamado pelos charlatões e pelos fanáticos, como aceito por inúmeras pessoas que experimentaram ou souberam por pessoas de suas famílias e das que não poderiam duvidar, por sua seriedade, da existência dessas materializações ou demonstrações evidentes dessa materialização da consciência das almas do além.

Não é preciso ampliar este aspecto da vida de além-túmulo, porque os homens estudiosos encontrarão inumeráveis testemunhos em muitas obras e principalmente na Revista que mantém a Sociedade de Descobrimentos Psíquicos de Londres, de fama mundial, e, mais que tudo, para não me separar do tema principal desta conferência.

Não é possível viver no mundo material sem ter que receber as impressões que, para a mesma vida neste plano inferior, são indispensáveis. Portanto, vamos agora estudar os casos em que esta consciência ocasiona erros de consciência, pela deficiência destes cinco sentidos, fenômenos que me poupo de relatar porque todos sabemos como é que eles nos enganam tão frequentemente, na vida diária, como estiveram em gerações passadas todos os homens antes que Galileu exclamasse Eppur si muove (E por si se move), fato de que me ocupo em minha obra As Duas Grandes Leis Espirituais.

A identificação da mente com o mundo material nos leva a uma série de erros que, paulatinamente, vão se desvanecendo através dos aparatos construídos para suprir a deficiência dos sentidos e poder descobrir a verdade, na ânsia irresistível de estudar e compreender as leis que governam a Natureza.

Não entrarei em detalhes que os cientistas se ocuparam em demonstrar e que não passam desapercebidos para as pessoas ainda de relativa cultura. Trataremos de como esses erros nos levaram à consciência um sem número de conhecimentos errados ou conceitos diferentes da verdade, que parece variável, relativa, à medida que se sucedem os descobrimentos, pois já se disse, com razão, que a verdade de ontem será a mentira de hoje, como a verdade de hoje será a mentira de amanhã, nessa incessante Evolução da Ciência.

Contudo, a Ciência, produto da experiência humana, resumo da Sabedoria dos séculos, e que abrange todos os grandes Mestres e todas as Grandes Doutrinas, tem seus princípios absolutos, porquanto ninguém os pode alterar, como a Lei da Causalidade Universal: não existe causa sem efeito, nem efeito sem causa; a parte não pode ser igual ao todo; a inércia absoluta não existe e outros princípios filosóficos; tudo isto, indiscutivelmente, visto desde o ponto de vista humano, ou seja, dentro do conjunto harmônico do Conhecimento adquirido através de seleções, por esses sentidos primordiais de nossa vida terrestre.

A Vontade não se subtrai a este vai vem dos conhecimentos, posto que estes foram achados pela mesma Vontade que impele à busca da Verdade, onde quer que esta se encontre.

O mesmo Progresso não é outra coisa que a Vontade que impele a avançar como uma poderosa corrente ilimitada. 

A Vontade é pois destruidora e construtora, como dizíamos no princípio; ela destrói uma verdade, que passa a ser mentira, quando descobre outra verdade, e assim o será indefinidamente enquanto existam universos.

Por isso é que os retardatários, mais afetados pela Vontade negativa, não podem entender o porquê do avanço progressivo da Vontade que produz o Progresso, e ficam criticando os passos dessa tocha que ilumina os que são maiormente orientados pela Vontade positiva. Razões para este fundamento se encontram aos milhares: Sócrates condenado a beber cicuta; os Profetas perseguidos e martirizados; Cristo e Seus Apóstolos colocados na situação de malfeitores; Colombo morre carregado de correntes; Cervantes de Saavedra ridicularizado e tratado de imoral; Pasteur vilipendiado; e, assim, os homens que mais imortalizaram seus nomes, passaram entre seus contemporâneos com o estigma do martírio, do sofrimento, ou, pelo menos, com o desprestígio e a perseguição de seus contemporâneos, sempre juízes implacáveis, falsos sábios, hipócritas.

Como bem declara Spengler, os homens, frutos de seu ambiente, não o podem reformar, senão muito pouco; são as gerações subsequentes as que reformam; e isto, teríamos que acrescentar, na maioria dos casos, na ordem moral, sujeitas essas modificações ao vai vem que às vezes demora séculos, por causa das deturpações das Doutrinas que introduziram os mais induzidos pela Vontade negativa.

O juízo e a inteligência nada valem ante a Energia da Vontade negativa, porque o discernimento, o juízo, o raciocínio, em suma, a razão e o bom senso, de que tanto se lança mão, ficam paralisados, porque a Vontade negativa os destrói, produzindo-lhes um espelhismo na consciência, como se produz este na consciência humana de quem caminha no deserto.

Todas as faculdades mentais, sendo obra da Vontade em seus dois aspectos, positivo e negativo, têm, em consequência lógica, em todos os homens, esse duplo aspecto; não há um homem absolutamente santo, bom em toda a extensão da palavra; o mesmo Cristo já o disse: Não há senão um bom: a saber, Deus; na terra não encontrou um só homem bom.

Assim, pois, observando o movimento ascendente do Progresso, em todas as suas faces, vemos que, em relação ao número de habitantes, poucos são os que têm consigo maior Vontade positiva: estes são os verdadeiros guias do mundo na ordem científica, e imensamente menor, muito poucos, os verdadeiros guias do mundo no aspecto espiritual.

Todos os pensamentos, expressões da vontade, estão sujeitos a um ou a outro aspecto ou manifestação dessa Energia misteriosa, que levanta do nada o que nada vale, ou levanta do nada o que vale.

São os valores positivos e negativos em cada indivíduo; os valores intrinsecamente inerentes ao todo, à humanidade.

Como livrar-nos desta situação? Como salvar-nos deste Mal ou ausência do Bem, para termos somente nossa Vontade positiva, sem a intromissão dessa Vontade negativa que tanto nos prejudicará em toda nossa vida terrestre e ainda no mais além?

Houve Doutrinas que dessem a chave deste problema? Sim. E como é que não se conhece? Porque foram adulteradas e, naturalmente, pondo-as em prática não dão nenhum proveito.

É a ignorância a causa do Egoísmo? Nem sempre, é a resposta que muitos se deram. Mas, em verdade, a Ignorância da Vontade negativa é a causa do Egoísmo, produtor de todos os pensamentos negativos, de todos os males.

Mas, nem sempre o Saber faz o homem moral. Quantos monstros sabemos que existem, amparados por seu próprio saber: nem sempre se harmonizam o saber e a moral, o saber e a educação; vemos homens ignorantes muito morais, como ao contrário, e assim também em seu trato social.

Quantos homens que ostentam um título universitário, aproveitam seus conhecimentos para inventar meios de destruição!
Quantos homens destroem vidas numa ou noutra forma amparados por seu saber!

O saber científico está, pois, cheio de pensamentos negativos e positivos, originados por uma só Vontade Oniabarcante.

Se estudarmos a vida, encontraremos que os atos de todos, a humanidade em conjunto, obedecem a leis invariáveis, e se o é no sentido material, a cujas leis tudo está subordinado, o espírito em conjunto de todos os seres, consequentemente, sob o aspecto espiritual, está também subordinado, daí que todas as dores que sentimos no corpo destroem nossas forças mentais, aniquilam nosso eu interior, curvam, por assim dizer, nosso espírito; como também os sofrimentos que habitam nosso espírito, se manifestam rapidamente, com maior ou menor intensidade, afetando nosso organismo, às vezes de forma fatal e irremediável; assim também vemos que as leis que atuam sobre nossas formas físicas, indiscutivelmente afetam nosso espírito em todo sentido. Por exemplo: ao ser atraído à terra, desde uma grande altura, junto com nosso corpo molecular, é atraído nosso espírito que se identificou com a forma externa na qual mora.

Quem pode se subtrair a essas forças da Natureza? Quem pode sustentar o contrário?

E isto é algo que os mais ignorantes compreendem, há uma predestinação em todas as coisas, que concorre sobre nossos corpos ao mesmo tempo que sobre nossas almas.

Imaginar que nós fôssemos autores de nossos destinos, é lamentavelmente uma heresia, porque se por um lado é negar a Onipotência do Altíssimo, que no fundo seria negar a existência da Divindade, por outro lado teríamos que confessar que não passaríamos por todos os sofrimentos e dores dos quais nos libertaríamos também por nossa vontade, mas não existe um só caso destes que se pudesse contar. Vemos, então, como é que essa ideia de nossa liberdade é aparente, assim como nossos próprios pensamentos, todos expressões de uma Vontade Oniabarcante, pois, assim como nós não somos autores de nossa vida física, menos poderíamos ser autores da vida do espírito, que cremos que vivifica nossas envolturas físicas. A reflexão seguinte vai aclarar muitos preconceitos.

Conversando uma vez com um cultíssimo sacerdote superior de um convento de Jesuítas, professor de Filosofia por mais de trinta anos, sobre o livre-arbítrio, veremos as razões que lhe dei e suas respostas, no diálogo que guardei bem em minha memória e que representará a quem quer que o leia, um suficiente despertar à Verdade.

O autor - Não creio no livre-arbítrio, nessa liberdade humana que o homem crê ter, e minhas razões são superiores porque não brotam de minha imaginação, são resultados da revelação, com provas inequívocas.

O sacerdote - Isto é impossível, porque Deus nos mandou ao mundo dando-nos completa liberdade para escolher entre o Bem e o Mal; do contrário, o mesmo seria ser bom ou mau; eu não haveria optado por abandonar o mundo com todas as possibilidades que tinha de triunfar na vida, para converter-me em um sacerdote, ao serviço do Senhor e Pai nosso, confiando em receber o prêmio que Ele oferece: o Céu.

Como poderíamos imaginar uma falta de Justiça, se, quando não a encontramos na Terra, é natural que a achemos no Céu, em Deus, que castiga os maus e premia os bons; não haveria mérito nem demérito: cairíamos no abismo de confundir o Bem com o Mal; e Deus nos dá o Discernimento para distinguir este do outro; temos inteligência, e portanto somos responsáveis por nossas ações; para isto, notamos que nossa consciência nos acusa quando obramos o mal, como se alegra quando obramos o bem; sustentar o contrário seria negar o que a consciência nos diz.

Por outro lado, Deus oferece o Paraíso para os bons e o Inferno para os maus; e isto é justo, pois se o homem comete uma falta para uma autoridade subalterna, terá uma pena legal que sofrer; se a falta fosse contra o Presidente da República, essa pena seria maior; não é certo? Assim também, uma falta para com Deus que é Infinito, a pena também tem que ser infinita, daí que os bons irão para o Céu por toda a eternidade e os maus para o Inferno por toda a eternidade.

O autor - Vamos por partes: primeiro trataremos este tema filosoficamente, depois, tomando por árbitro o próprio Senhor Jesus Cristo, cujas palavras, escritas pelos Apóstolos, nos esclarecerão a Verdade.

Em primeiro lugar, ninguém poderia conceber um Deus que não tivesse os seguintes atributos: Onipotência, Onisciência e Onipresença. Ele tem poder sobre tudo que existe, que Ele criou. Todos o sabem, está Ele presente em todas as partes; livre do Tempo e do Espaço que Ele mesmo criou, é Absoluto. Pois bem, como consequência desses atributos fundamentais, para conceber em nossa imaginação a ideia de Deus, temos que aceitar a Justiça, atributo indispensável depois dos três primeiros atributos.

Vamos, agora, fazer nossas reflexões filosóficas: se Deus é Onisciente, tudo sabe, o passado e o futuro, ou seja, como a mesma Religião Católica sustenta, para Deus só existe o tempo presente; bem, se houvesse dado ao homem essa liberdade, Ele saberia de antemão o uso que o homem faria dessa liberdade.

Ponhamos um exemplo para esclarecer mais este assunto: Nós não viemos por nossa vontade humana a este mundo, viemos pela Vontade de Deus. É certo?

O sacerdote - É certo.

O autor - Mandou-nos os dois, dando-nos liberdade para escolher um dos dois caminhos, o Bem ou o Mal.

O sacerdote - Assim é, assim é.

O autor - O senhor, ponhamos, pois, o exemplo, escolheu o caminho do Bem, fez-se sacerdote, depois chegou a ser Bispo, Arcebispo, Cardeal e, por último, chegou a ser um santo, chegou a ser Sumo Pontífice. Eu escolhi o caminho do Mal, cheguei a ser o pior homem do mundo. Vem o Dia do Juízo Final, a hora de prestar contas.

O sacerdote - Sim, porque teremos que comparecer ante o Tribunal de Deus.

O autor - Muito bem, somos julgados: o senhor irá para o Céu por toda a Eternidade e eu irei condenado aos Infernos por toda a Eternidade.

Vamos demonstrar que absurdo é isto: como Deus sabe tudo, porque é Onisciente, Ele saberia, então, de antemão, que o senhor, recebendo essa liberdade, ia escolher o caminho do Bem; e eu ia escolher o caminho do Mal. Quer dizer que, sabedor do uso que íamos fazer de nossa liberdade, já sabia a que fim íamos chegar: o senhor ao Céu por toda a Eternidade e eu aos Infernos por toda a Eternidade; o que quer dizer que, de antemão, já os dois estávamos sentenciados, antes de vir ao mundo: um aos Céus e outro aos infernos, o que constitui um absurdo, porque seria desconhecer a Justiça Divina, resultante dos três atributos essenciais da Onisciência, Onipotência e Onipresença Não é assim.

O sacerdote (tomando com ambas as mãos a cabeça, como quem não tem saída) não tem como responder.

O autor - isto é humanamente falando, filosoficamente, com deduções fáceis. Vamos ver agora qual é o testemunho de Cristo, o que Ele nos disse. Nosso Senhor Jesus Cristo não nos fala desta liberdade humana; tudo ao contrário; Ele, com seu exemplo, nos convida a segui-lo: O que quiser alcançar a Glória Eterna, negue-se a si mesmo, tome sua cruz e siga-me. Pois bem, diga-me o senhor quando se declarou Ele livre? Acaso Ele não declarou repetidíssimas vezes que Ele não veio fazer sua vontade senão cumprir a Vontade de quem o enviou, do Pai? Não consta também que Ele se fez obediente ao Pai até a morte e morte de cruz? Não se confirma assim quando pospõe sua vontade humana à Vontade Divina, quando disse, três vezes consecutivas, Se não é possível que passe de mim este cálice sem que eu o beba, faça-se a Tua Vontade e não a minha, referindo-se aos padecimentos que tinha que sofrer em mãos de seus inimigos? Então, devemos imitar a Cristo, fazendo-nos obedientes a Deus e negando-nos a nós mesmos.

O sacerdote - Eu lhe confessarei que não pode haver um sacerdote sem a Obediência e a Negação.

O autor - Se isto é assim, por que não o ensinam ao Mundo?

O sacerdote - Porque o mundo não está preparado.

O autor - Por que não o preparam?

O sacerdote - Porque o Papa não o ordenou ainda.

Terminou aqui o diálogo que tive com esta altíssima autoridade do sacerdócio católico, pois sabida é a vasta cultura que têm os sacerdotes jesuítas.

Ao final, estávamos de completo acordo; mas, o que já não tive oportunidade de esclarecer-lhes foram os fundamentos desta Obediência a Deus, que se constituem nos Dez Mandamentos da Lei e nos Estatutos ensinados por Cristo, porque a Obediência, conforme declara São Paulo, Não é para libertinagem.

Com estes antecedentes, poderão todos ter uma ideia exata do papel que desempenha a vontade humana, irreal, infinitamente limitada, que deve ser morta e substituída pela Vontade de Deus, que foi a Vontade à qual obedecia o Mártir da Galileia, que se imolou a si mesmo para libertar-nos das trevas da Ignorância, ensinando a Verdade Absoluta, à qual Ele chegou em Sua Unificação com o Pai, o Criador e Redentor nosso.

Não me ocuparei mais extensamente sobre este aspecto em minha conferência, porque em meu livro, As Duas Grandes Leis Espirituais, me ocupei dele com relativa amplitude.

Omito, também, declarar as múltiplas ofertas que tive do mencionado sacerdote jesuíta para que entrasse para sua congregação, conceituando que a Religião Católica não ensina a Verdadeira Doutrina de Cristo e, ao contrário, mesclando toda espécie de preconceitos e raciocínios humanos, trocou o critério do mundo, entrando no grande desvio, predito pelos Profetas, pelo mesmo Senhor e por Seus Apóstolos, fato que em si representa a substituição da Doutrina Divina pela doutrina do Demônio, do Anjo das Trevas, da Ignorância.

Alguém poderá objetar, inteligentemente: E o pecado onde fica? Eu lhe responderei: O pecado foi redimido, porque, justificadas nossas consciências dentro da Obediência a Deus, cumprindo Seus Santos Mandamentos e Estatutos, já não podemos ter ideia do pecado. Para o perfeito, tudo é perfeito; para o que é imundo há coisas imundas, tema vastíssimo que desenvolverei em próximas conferências.

Vemos, pois, em suma, que esses dois aspectos da Vontade Divina, exteriorizados pela vontade humana, são a ação e a reação de duas forças que se repelem reciprocamente, até que, aparecendo em nosso pensamento a Vontade Divina, pensando nós como pensou o Redentor, iremos paulatinamente nos identificando com esses Atributos Divinos, que vislumbramos alcançar, seguindo perseverantemente o Caminho do Senhor, de Seus Santos Apóstolos e discípulos, à medida que avançamos no áspero mas luminoso Caminho que conduz à fusão de nosso eu com o EU UNIVERSAL, pela identificação de nossa vontade inferior com nossa Grande Vontade Superior, Angélica, Divina, que atua dentro dos princípios eternos, traçados pelo exemplo do Maior dos Mestres, o Redentor Maior que teve, tem e terá o mundo.

(*) Conferência Pública do Professor Julio Ugarte y Ugarte escrita na cidade do Rio de Janeiro em 22 de agosto de 1939.

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